Chegou ao final o processo em Tribunal à morte de Sara Carreira. Quatro arguidos foram considerados culpados na morte da filha de Tony Carreira e Fernanda Antunes, três a pena de prisão suspensa, um a pena de multa.
Na vida real toda a gente vai para casa, ninguém vai preso e está tudo certo, não era nada disso que eu pretendia, e Deus lhes dê muita sorte e os abençoe”, dizia Tony Carreira, à saída do Tribunal de Santarém, após a revelação das sentenças.
O jornalista Luís Osório dedicou-lhe o seu ‘Postal do Dia’, ao discorrer os seus pensamentos sobre este tema tão doloroso, dos pais que perderam uma filha com apenas 21 anos.
“Sara Carreira será jovem para sempre
1.
Chegou ao fim o julgamento, felizmente.
Que se vire a página, é tempo de se virar a página.
A Sara partiu em dezembro de 2020, o tempo é inapelável, faz-nos esquecer demasiadamente depressa as coisas, mesmo as que nos impressionaram muito, mesmo as que nos roubam as lágrimas aos olhos.
Hoje não é dia de festa para a família Carreira. Para eles o tempo tornou-se outra coisa, tornou-se o oposto do que é para nós, perder uma filha ou um filho é a mais cruel de todas as provações, uma espécie de condenação de morte em vida, um holocausto.
Para Tony e Fernanda.
Para os irmãos, o tempo passou a ser mais lento.
2.
Sara Carreira teria 24 anos.
Impossível, mesmo não a tendo conhecido, acreditar que morreu. Quando a vemos torna-se impossível por ser luz, por ser futuro, por ter a idade dos nossos filhos ou netos, por nela tudo ainda parecer ser vontade de comer o mundo, de fazer coisas, de se cumprir.
Parecia um anjo.
Espero que o seja agora, com asas e tudo.
Tinha a idade do meu filho mais velho, uns meses mais nova.
E a Sara passou a existir na minha vida porque não há movimento que faça com os meus filhos, não há Natal que possa celebrar no futuro sem dela me lembrar, sem de Tony Carreira e de Fernanda me lembrar, para eles nunca mais será possível montar a Árvore de Natal da mesma maneira, nunca mais poderão trocar prendas sem pensar naquele fim-de-tarde chuvoso e na memória da sua Sara, nunca mais poderão esperar pela meia-noite, brincar como antes, sorrir como antes, viver como antes.
3.
A vida é insondável.
Por vezes uma maravilha que julgamos não merecer.
Outras um inferno que nos ameaça queimar por dentro.
É nisso que volto a pensar, nestes dias em que tudo ficou decido em tribunal.
Conheço mal Tony Carreira.
Mas é absolutamente indiferente.
Conheço-o sem o conhecer.
Como tu.
Acompanhamo-lo e existe como se fosse nosso vizinho, amigo ou família.
Mesmo sem querer temos opiniões acerca do que faz.
Cumprimentamo-lo se nos passar ao lado.
Ele não nos conhece, mas nós conhecemo-lo.
E a morte brutal de Sara é a prova disso.
Porque a dor dele, a dor de Fernanda, passou a ser a nossa.
E a partida dela, tão bela e tão jovem, é a antecipação do inominável se o destino nos tivesse escolhido a nós e não a eles.
4.
Sara Carreira teria 24 anos.
E certamente que nesta altura terá outras prioridades.
Acredito que sim, continuo a acreditar que a vida não se esgota neste caminho.
Não faria sentido algum, pois não?
Por isso, é tempo de virar a página e de a começar a celebrar olhando para a vida e não para a morte.
Vendo a luz e não a escuridão.
Percebendo que a Sara é, ainda assim, uma celebração da vida – mesmo quando a vida é brutal e nos esmaga o entendimento ela ficará como um ícone da juventude eterna, da esperança eterna, da beleza que nos faz, apesar de todas as monstruosidades, ter empatia, querer abraçar quem precisa de um abraço, comovermo-nos, sermos pessoas inteiras.
Obrigado, Sara.
Espero-te bem.
Um dia trocaremos conversa”.